A alfabetização na
perspectiva freireana é perceptível claramente em seu método e
suas práticas, e ao
decorrer da alfabetização e realização do método podemos analisar o letrar
e sua perspectiva como um
conjunto em que dificilmente alfabetização, letramento e
características
histórico-culturais estão dissociados.
A alfabetização é muitas vezes tomada
como uma aprendizagem de leitura e escrita
simplesmente, e se
observarmos somente dessa forma ingênua e tradicional de perceber a
alfabetização não
estaremos observando princípios básicos da educação, como uma real
aprendizagem e
letramento, uma necessária práxis que sirva para o aprendizado e não para a
impossibilidade de
prosseguimento no conhecimento pelo uso de leitura e escrita. Nesta visão,
pode se observar o
educando não como ser, mas deposito de conhecimentos, algo que
frequentemente ocorre com
muitas pessoas que lêm, mas não interpretam o que tem lido, pois
recebem o código
linguístico sem realmente serem letradas. Paulo Freire sempre teve uma
visão abrangente que
contém as características do letramento e da importância da leitura,
leitura que para ele tem
por finalidade inserir o indivíduo em um contexto de conhecimento e
sabedoria para uma
formação de conhecimento, algo que uma educação bancaria não objetiva.
“(...) o ato de estudar,
enquanto ato curioso do sujeito diante do mundo é expressão da forma
de estar sendo dos seres
humanos, como seres sociais, históricos, seres fazedores,
transformadores, que não
apenas sabem mas sabem que sabem.” (FREIRE, ,2009, p.60).A
visão de Paulo Freire, é
um realmente estudar, aprender, e no caso da alfabetização possui um
ultrapassar do conceito
bancário, pois existe um real e implícito letramento.
Observa-se o letrar na visão freireana,
pois se deve realmente ter o conhecimento,
não como seres passivos,
mas compreendedores em uma real necessidade e aprendizagem da
linguagem e da escrita,
necessidade esta que se demonstra como algo da realidade, da vida
social, e também como
seres fazedores, demonstrando que se deve usar a escrita, e que esta é
uma necessidade social
desde sua aquisição. Estes fatos reforçam o que a maioria de
estudiosos tem concluído
sobre o letramento, que seria para as necessidades de utilização de
escrita e leitura
exigidas pela sociedade e de importância nas várias práticas sociais.
Paulo Freire, além de expressar
características do letramento amplamente aceito, as
ultrapassa. O aprendizado
deve realizar-se visando o ser não como passivo, mas como sujeito
ativo, e também se deve
valorizar o social, histórico, e ação de seres transformadores. O
letramento tradicional
pode ter como foco o acesso a varias fontes escritas, desvalorizando os
que não têm acesso,
desconsidera-os como iletrados, incultos, pessoas “ignorantes absolutos”,
(PINTO, 1989, p.61) em
que os menos favorecidos são ignorantes por não saberem algo e os
das classes populares são
cultos por saberem alguma coisa. Paulo Freire ultrapassa essa noção
ingênua de letramento e
demonstra que mesmo pessoas com pouco acesso à leitura, possuem
conhecimento da linguagem
e letramento de vida em uma perspectiva construtivista.
(...) combater, por
exemplo, a posição ideológica, por isso mesmo nem sempre explicitada, de que só
se estuda na escola (...)
“saber de experiência feito”, tem de ser o ponto de partida em qualquer
trabalho de educação popular
orientado no sentido da criação de um conhecimento mais rigoroso por
parte das massas populares.
Enquanto expressão da ideologia
dominante, este mito penetra as massas populares provocando nelas
às vezes autodesvalia por se
sentirem gente de nenhuma ou de muito pouca leitura “(FREIRE, 2009,
p.59-60)
Não visa o adequar-se à
realidade, que é o que ideologicamente poderia ser usado no
letramento tradicional
para uso na sociedade complexa e suas diversas utilidades da escrita,
mas ultrapassando-a de
maneira critica, de um cidadão que usa a linguagem e seus
conhecimentos para
transformar a situação.
Em
questão de política, o letramento, se torna a leitura de mundo, por ela qualquer
homem tem um letramento e
sabe alguma coisa, assim como Tfouni, focaliza os aspectos
sócios históricos do
homem, “Enquanto a alfabetização se ocupa da aquisição da escrita por
um indivíduo, ou grupo de
indivíduos, o letramento focaliza os aspectos sócio históricos da
aquisição de uma
sociedade” (TFOUNI, 1995, p. 20 apud COLLELO), e como Paulo Freire
tem sua “ideia-fonte”
citado por Fiori como “lúcido saber sócio pedagógico” (, 2005, p.8)
assim, observa-se um
método não como simples técnica de aprendizagem de leitura e escrita,
observando a totalidade
que ultrapassa nestes e muitos outros aspectos o que vem a ser
letramento. “As técnicas
do método de alfabetização de Paulo Freire, embora em si valiosas,
tomadas isoladamente não
dizem nada do método”, (FREIRE apud FIORI, 2005, p.9), portanto,
não pode ser tratada como
simplesmente uma técnica mas com uma visão ideológica
em que alfabetizar é
humanizar. Reforçando esse aspecto “sensível” e humano, a Magda
Soares expõe que
"Letramento é, sobretudo, um mapa do coração do homem, um mapa de
quem você é, e de tudo
que pode ser.", Paulo Freire observa esse mapa da condição de
oprimido do ser, que
passa pela leitura de mundo e reflexão das causas sociais, que leva a uma
conscientização, um
pensar certo, uma real leitura de mundo e das condições de vida.
De grande valor é a contribuição de Freire
em relação à leitura de mundo em que o
ato de ler tem como ponto
de partida a experiência de vida, leitura do contexto, depois da
palavra. Paulo Freire
busca aprofundar este letramento para que forme a leitura da palavra
mundo, este letramento é
o mais reconhecido de Paulo Freire e tem muitas lições a nos dar.
"na verdade, o
domínio sobre os signos linguísticos escritos, mesmo pela criança que se
alfabetiza, pressupõe uma
experiência social que o precede – a da 'leitura' do mundo”
(CARTAS A GUINÉ-BISSAU
1984 apud WIKIPEDIA) Esta percepção desmistifica a visão
ingênua e ideológica de
que os de famílias com pouco acesso a leitura tendem a ser
“ignorantes em absoluto”,
e que por sua falta de conhecimento dificilmente serão letrados, e
que não poderão
transformar a situação. Segundo Freire citado por Arruda (2009) “Aprender a
ler e a escrever é
aprender a ler o mundo, compreender o seu contexto numa relação dinâmica
vinculando linguagem e
realidade e ser alfabetizado é tornar-se capaz de usar a leitura e a
escrita como meio de
tomar consciência da realidade e de transformá-la.” Paulo Freire se
volta aos oprimidos e
demonstra que eles possuem letramento, o da leitura do mundo, o da
leitura da sua realidade
e que este é um reforço para um letramento escrito que ultrapasse e
transforme as práticas de
dominação em uma “práxis revolucionária” em “colaboração” em
dialogo o educador é um
mediador, e o letramento não é dado pronto e obrigatório mas “ato
curioso do sujeito diante
do mundo”.
Diante
do citado, percebe-se que o letramento defendido por freire é diferente do
tradicional, é um modelo
ideológico. Segundo Street citado por Kleiman (1995, p.38), o
letramento ideológico não
se trata simplesmente de aspectos da cultura letrada, mas estruturas
de poder da sociedade, e
Paulo Freire foca nas lutas sociais, educação como prática de
liberdade, alfabetização
e letramento que ultrapasse as praticas sociais e relações de poder.